O Padrão Bíblico de Avivamento - Por Rev. Josivaldo de França Pereira
Qual o padrão bíblico de avivamento? Os avivamentos bíblicos oferecem alguma
coordenada para a renovação da igreja evangélica no Brasil de hoje?
Estas
são algumas das perguntas que procuraremos responder no decorrer desse estudo.
I - O significado bíblico
do termo "Avivamento":
1.1. No Antigo Testamento:
O verbo hebraico hyh (avivar)
tem o significado primário de "preservar" ou "manter vivo".
Porém, "avivar" não significa somente preservar ou manter vivo, mas
também purificar, corrigir e livrar do mal. Esta é uma conseqüência natural em
toda vez que Deus aviva. Na história de cada avivamento, dentro ou fora da
Bíblia, lemos que Deus purifica, livra do mal e do pecado, tira a escória e as
coisas que estavam impedindo o progresso da causa (1).
O
verbo "avivar", em suas várias formas (2), é usado mais de 250 vezes
no Antigo Testamento, das quais 55 vezes estão num grau chamado piel. Um verbo
nas formas do Piel expressa uma ação ativa intensiva no hebraico. Neste
sentido, o avivamento é sempre indicado como uma obra ativa e intensiva de
Deus. Alguns exemplos de sua ocorrência são as clássicas orações de Davi, como
esta: "Porventura, não tornarás a vivificar-nos (3), para que em ti se
regozije o teu povo?" (Sl 85.6) (4), e da clássica oração do profeta
Habacuque: "Tenho ouvido, ó Senhor, as tuas declarações, e me sinto
alarmado; aviva a tua obra, ó Senhor, no decorrer dos anos, e, no decurso dos
anos, faze-a conhecida; na tua ira, lembra-te da misericórdia" (Hc 3.2).
1.2. No Novo Testamento:
Encontramos no Novo Testamento grego um conjunto de palavras que expressam o
conceito básico de avivamento. São elas: 'egeíro, 'anastáso, 'anázoe e
'anakaínoo. Outras palavras gregas comparam o avivamento ao reacender de uma
chama que se apaga aos poucos (cf. 'anazopyréo em 2 Tm 1.6) ou uma planta que
lança novos brotos e "floresce novamente" (cf. 'anaphállo em Fp
4.10).
No
Novo Testamento grego as palavras supracitadas aparecem, no contexto de
avivamento, apenas sete vezes, embora a idéia básica de avivamento seja
sugerida com mais freqüência. Uma possível explicação para o uso escasso dos
termos, em comparação ao Antigo Testamento, é que o Novo cobre apenas uma
geração, durante a qual a Igreja Cristã desfrutou, na maior parte do tempo, um
grau incomum de vida espiritual.
II - O que não é avivamento
bíblico:
Antes
de falarmos sobre avivamento bíblico, propriamente dito, acreditamos ser de
grande ajuda uma abordagem, mesmo que rápida, do que não é o padrão bíblico de
avivamento.
O
Rev. Hernandes Dias Lopes, em seu livro AVIVAMENTO URGENTE, apresenta sete
interessantes razões sobre o que não deve ser entendido como avivamento de
verdade. Sou devedor ao dileto colega por suas pertinentes observações.
Transcrevo-as quase que na íntegra.
2.1. Avivamento não é um
programa agendado pela igreja.
Avivamento não é ação da igreja, mas de Deus. Avivamento é obra soberana e
livre do Espírito Santo. A igreja não promove e nem faz avivamento. A igreja
não é agente de avivamento. A igreja não agenda e nem programa avivamento. A
igreja só pode buscar o avivamento e preparar o caminho da sua chegada. A
igreja não produz o vento do Espírito, ela só pode içar suas velas em direção a
esse vento.
A
soberania de Deus, no entanto, não anula a responsabilidade humana. O
avivamento jamais virá se a igreja não preparar o caminho do Senhor (5). O
avivamento jamais acontecerá se a igreja não se humilhar. Sem oração da igreja,
as chuvas torrenciais de Deus não descerão. Sem busca não há encontro. Sem
obediência a Deus, jamais haverá derramamento do Espírito. Contudo, quem
determina o quando e o como do avivamento é Deus. Ele é soberano. David
Brainerd orou vários anos pelo avivamento entre os índios peles vermelhas no
século XVIII. Aquele jovem, ajoelhado na neve, suava de molhar a camisa, em
agonia de alma, em oração fervente, em favor daqueles pobres índios. Quando o
seu coração parecia desalentado e já não havia prenúncios de chuva da parte de
Deus, o Espírito foi poderosamente derramado e os corações se dobraram a Cristo
aos milhares.
2.2. Avivamento não é
mudança doutrinária.
Cometem ledo engano aqueles que querem descartar a teologia e desprezar a
doutrina na busca do avivamento. Desprezar a doutrina é dinamitar os alicerces
da vida cristã. Desprezar a doutrina é querer levantar um edifício sem lançar o
fundamento. Desprezar a doutrina é querer por um corpo de pé e em movimento sem
a estrutura óssea.
Não
há vida piedosa sem doutrina. A doutrina é a base da ética. A teologia é mãe da
ética. "Assim como o homem crê no seu coração, assim ele é" (Pv
23.7).
Vida
sem doutrina gera misticismo e experiencialismo subjetivista. Avivamento sem
doutrina é fogo de palha, é movimento emocionalista, é experiencialismo
personalista e antropocentrista. Deus tem compromisso com a verdade e a sua
Palavra é a verdade e todo avivamento precisa estar fundamentado na Palavra. O
avivamento precisa estar norteado pelas Escrituras e não por sonhos e visões.
Precisa estar dentro das balizas da Bíblia e não dentro dos muros de revelações
subjetivistas, muitas vezes feitas na carne.
2.3. Avivamento não é
mudança litúrgica.
Muitos crentes confundem avivamento com forma de culto, com liturgia animada,
com coreografia e instrumental aparatoso.
Louvor
não é encenação. Não é mimetismo. Não é ritualismo. Não é emocionalismo. Não é
apenas seguir formas pré-estabelecidas, como bater palmas, dizer aleluia, amém
e levantar as mãos. Louvor não é pululância, gingos e dança (6). Louvor que
apenas levanta as mãos para o alto, mas não as estende para o necessitado não
agrada a Deus. A Bíblia ordena levantar mãos santas ao Senhor, num gesto de
rendição e entrega (I Tm 2.8). Louvor em que a pessoa apenas saltita e pula,
mas não vive em santidade, é ofensa a Deus. Louvor que apenas verbaliza coisas
bonitas para Deus, mas não leva Deus a sério na vida é fogo estranho diante do
Senhor.
Louvor
que não produz mudança de vida, quebrantamento, obediência e não leva as
pessoas a confiarem em Deus, não é louvor, é barulho aos ouvidos de Deus. Assim
diz o Senhor: "Afasta de mim o estrépito dos teus cânticos; porque não
ouvirei as melodias das tuas liras" (Am 5.23).
Hoje
estamos vivendo a época dos shows evangélicos, dos show-men, dos animadores de
programas religiosos, do "rock evangélico", das músicas badaladas por
um ritmo sensual.
Mais
do que nunca é preciso tocar a trombeta em Sião e condenar a idéia de que
precisamos imitar o mundo para atrair o mundo. A música do mundo tem entrado
nas igrejas, para vergonha nossa e para derrota nossa. O louvor que agrada a
Deus precisa ser em espírito e em verdade. O louvor precisa ser bíblico, senão
é fogo estranho. Davi, no Salmo 40, versículo 3, fala-nos sobre as balizas do
louvor que agrada a Deus: "E me pôs nos lábios um novo cântico, um hino de
louvor ao nosso Deus; muitos verão estas coisa, temerão e confiarão no Senhor".
Primeiro, vemos a origem deste cântico: "E me pôs nos lábios". Este
louvor vem de Deus e não do homem. Segundo, vemos a natureza deste cântico:
"E me pôs nos lábios um novo cântico". Não é um novo de edição, mas
novo de natureza. É um cântico que expressa a marca da sua nova vida, liberta
do tremendal de lama (v2). Terceiro, vemos o objetivo deste cântico: "...
Um hino de louvor ao nosso Deus". Este cântico não é para entreter ou
agradar o gosto e preferência das pessoas. Este cântico vem de Deus e volta
para Deus. Deus é o seu alfa e o seu ômega. Quarto, vemos o resultado deste
cântico: "Muitos verão estas coisas, temerão e confiarão no Senhor".
O louvor bíblico leva as pessoas a temerem a Deus, a confiarem em Deus. O
verdadeiro louvor leva as pessoas a se voltarem para Deus.
O
louvor não é um espaço da liturgia. Louvor é a totalidade da vida.
"Bendirei ao Senhor em todo o tempo, o seu louvor estará sempre nos meus
lábios" (Sl 34.1).
À
luz destas coisas, é preciso dizer que avivamento não é mudança litúrgica, é
mudança de vida. Avivamento não é histeria carnal, é choro pelo pecado. Deus
não procura adoração. Ele procura adoradores.
Todavia,
é preciso dizer que, embora o avivamento não seja mudança de liturgia, todo
avivamento mexe com a liturgia. O avivamento desinstala a liturgia ritualista,
cerimonialista, formalista, fria e morta e põe em seu lugar uma liturgia viva,
alegre, ungida, onde há liberdade do Espírito, sem abandonar a ordem e a
decência. Em épocas de avivamento, a liturgia é desingessada e o povo com
alegria e liberdade do Espírito adora a Deus, em espírito e em verdade, sem
regras rígidas pré-estabelecidas. Cada culto é um acontecimento singular, novo,
onde há abertura para o que Deus deseja falar e fazer com o seu povo.
Hoje
existem muitos cultos solenes, aparatosos, pomposos, mas estão mortos. Disse J.
I. Packer no seu livro "Na Dinâmica do Espírito": "Não há nada
mais solene do que um cadáver. Há cultos solenes que estão mortos". Embora
o avivamento não seja mudança litúrgica, todo avivamento muda a liturgia,
tornando-a bíblica, alegre, ungida, dirigida pelo Espírito de Deus. Devemos
clamar como os puritanos: "Queremos liturgia pura".
2.4. Avivamento não é uma
ênfase carismática unilateral.
Muitas pessoas hoje estão limitando o avivamento a milagres, curas e
exorcismos, sem observarem a abrangência global da doutrina pneumatológica.
Este é um sério perigo. Toda vez que super-enfatizamos uma verdade em
detrimento de outra, nós produzimos deformações e distorções nesta verdade.
Deus
pode e faz maravilhas, curas e prodígios extraordinários quando Ele quer. Ele é
soberano. Ninguém pode deter a sua mão. Ninguém pode ser o conselheiro de Deus.
Ninguém pode instruir a Deus e dizer o que Ele pode e o que Ele não pode fazer.
Ninguém pode obstaculá-lo nem ensinar-lhe qualquer coisa. Ele faz tudo quanto
Ele quer, como quer, onde quer, quando quer, com quem quer. "Ele faz todas
as coisas conforme o conselho da sua vontade" (Ef 1.11). Ele não obedece à
agenda dos homens. Ele não se deixa pressionar. Ele é livre.
Entretanto,
esta não é a ênfase do avivamento. A igreja hoje está correndo mais atrás de
sinais do que atrás de santidade. A igreja hoje empolga-se mais com milagres do
que com vida cheia do Espírito. A igreja hoje anseia mais as bênçãos de Deus do
que o Deus das bênçãos. A igreja hoje busca mais uma vida antropocêntrica do
que teocêntrica.
Avivamento
não é efervescência carismática. Uma igreja pode ter todos os dons sem ser uma
igreja avivada. Avivamento não é conhecido pelos dons do Espírito, mas pelo
fruto do Espírito.
A
igreja de Corinto possuía todos os dons, todavia, era uma igreja imatura e bebê
espiritualmente. Naquela igreja profundamente carismática, havia divisões,
cismas, brigas, partidos, contendas, imoralidade e irmãos levando outros irmãos
aos tribunais mundanos. Havia falta de compreensão acerca do casamento e da
liberdade cristã. Naquela igreja a ceia do Senhor estava sendo incompreendida,
os dons estavam sendo usados erradamente, a ressurreição dos crentes estava
sendo negada, e a cooperação financeira com os pobres negligenciada.
É
verdade que, em épocas de avivamento, os dons são buscados e exercidos para a
glória de Deus e a edificação da igreja, mas a ênfase carismática não é
sinônimo de avivamento.
2.5. Avivamento não é
modismo.
Muitos crentes, por desconhecimento, se posicionam contra o avivamento porque
acham que ele é a mais nova onda da igreja. Acham que avivamento é uma
coqueluche moderna e uma inovação sem nenhum respaldo bíblico e histórico.
Certamente,
aqueles que assim pensam não estudam com critério a Bíblia nem a história da
igreja. Os pontos culminantes da igreja aconteceram em épocas de avivamento.
Desde o Antigo Testamento que esta é uma verdade incontestável. É só olhar para
os grandes despertamentos na época de Ezequias, de Josias e de Neemias. É só
ver o grande avivamento em Jerusalém, em Samaria, em Antioquia da Síria e em
Éfeso. É só ver o que Deus fez na Reforma do Século XVI, na Inglaterra, no
século XVIII e em outros grandes avivamentos da história. Certamente,
avivamento não é uma onda, não é um modismo. Ele possui firmes lastros
históricos. Ele é nossa herança e nosso legado e deve continuar sendo nossa
aspiração e nossa busca constante.
2.6. Avivamento não é uma
visão dicotomizada da vida.
Muitas pessoas, quando começam a buscar avivamento, saem da realidade e
enclausuram-se nos castelos inexpugnáveis de uma espiritualidade isolada e
monástica. Tornam-se tão "espirituais" que já não sabem mais conviver
com a vida, isolam-se, fazendo da vida uma caverna de fuga. Querem sair do
mundo em vez de serem guardados do mal. Dividem a vida entre sagrado e profano,
corpo e alma, matéria e espírito. Acham que Deus está interessado apenas nas
coisas espirituais. Acham que Deus só olha para a vida de trabalho na igreja, sem
observar os negócios, a família, o trabalho, os estudos e a vida do dia-a-dia
com o mesmo interesse.
Esta
não é a visão bíblica nem a visão do verdadeiro avivamento. Tudo em nossa vida
é vazado pelo sagrado. Toda a nossa vida é cúltica. Todo o nosso viver é
litúrgico. O grande avivalista John Wesley lutou pelas causas sociais na
Inglaterra ao mesmo tempo que pregou sobre avivamento. Finney pregou
ardorosamente contra a escravidão nos EUA no século passado ao mesmo tempo que
foi o maior avivalista do seu país. João Calvino atacou com veemência os juros
extorsivos em Genebra. O avivamento sempre traz profundas mudanças políticas,
econômicas, sociais e morais. O avivamento não leva a igreja à fuga, mas ao
enfrentamento.
2.7. Avivamento não é
campanha de evangelização.
Não podemos confundir avivamento com campanhas evangelísticas. Avivamento é
para a igreja, pessoas que já têm vida; evangelização é para o mundo, pessoas
que estão mortas em delitos e pecados. Avivamento é para crentes nascidos de
novo; evangelização é para pecadores inconversos. Na evangelização, a igreja
trabalha para Deus; no avivamento, Deus trabalha para a igreja. Na
evangelização, a igreja vai aos pecadores; no avivamento, os pecadores correm
para a igreja. Na evangelização, os pregadores apelam aos pecadores; no
avivamento, os pecadores apelam aos pregadores.
III - O Padrão Bíblico de
Avivamento:
Podemos
definir o avivamento bíblico em dois sentidos distintos:
3.1. O sentido estrito de
avivamento.
Estritamente falando, avivamento é algo que acontece unicamente no meio do povo
de Deus. O Espírito Santo renova, reaviva e desperta a igreja sonolenta. É
revitalização onde já existe vida. Ou, como disse Robert Coleman, é "o
retorno de algo à sua verdadeira natureza e propósito" (7).
Comentando
um pouco mais sobre o sentido estrito de avivamento, diz o Dr. Martin
Lloyd-Jones:
É
uma experiência na vida da Igreja quando o Espírito Santo realiza uma obra
incomum. Ele a realiza, primeiramente, entre os membros da Igreja: é um reviver
dos crentes. Não se pode reviver algo que nunca teve vida; assim, por
definição, o avivamento é primeiramente uma vivificação, um revigoramento, um
despertamento de membros de igreja que se acham letárgicos, dormentes, quase
moribundos (8).
Quando
há esse impacto da obra do Espírito de Deus na vida da igreja, os resultados
imediatos do avivamento são sentidos no povo de Deus: senso inequívoco da
presença de Deus; oração fervorosa e louvor sincero; convicção de pecado na
vida das pessoas; desejo profundo de santidade de vida e aumento perceptível no
desejo de pregação do evangelho. Em outras palavras, a igreja amortecida e
tristemente doente é a primeira a ser beneficiada pelo avivamento.
3.2. O sentido amplo de
avivamento.
Como a própria expressão define, neste sentido não apenas a igreja, mas a
sociedade não-cristã também é beneficiada pelo avivamento. Isto acontece
porque, além da atuação soberana do Espírito Santo no mundo, na igreja passa a
existir uma conscientização profunda de sua missão; isto é, a missão integral
de servir o mundo evangelística e socialmente. No avivamento a igreja vive a
missão para a qual foi chamada.
A
sociedade não-cristã, por sua vez, volta-se para Deus em resposta ao evangelho.
Acertadamente o Dr. Héber de Campos comenta que "o reavivamento começa na
igreja e termina na comunidade maior onde ela vive. Os efeitos do reavivamento
são muito mais perceptíveis nas mudanças morais que acontecem na região ou num
país onde ele acontece. Ele não se limita simplesmente aos membros das igrejas
atingidas pela obra de Deus. Ele causa impacto em toda a comunidade onde a
igreja de Deus está inserida" (9).
Em
suma, as duas características principais do avivamento são 1) o extraordinário
revigoramento da igreja de Cristo e 2) a conversão de multidões que até o
momento estiveram fora dela na indiferença e no pecado.
3.3. Avivamento e a Bíblia.
Aqui também abordaremos dois aspectos essenciais do avivamento.
1) O padrão bíblico de avivamento é a Bíblia
Por mais simplória e pleonástica que esta declaração pareça ser, ela é tão
autêntica e singular como dois e dois são quatro. Estamos falando do único
padrão inerrante e infalível de avivamento: a Bíblia.
Uma
vez que a Bíblia é a nossa única regra de fé e prática, é ela e somente ela que
nos pode dar a direção certa deste assunto. A relação entre a Bíblia e o
avivamento é tão intrínseca que é impossível um avivamento de verdade sem que a
Bíblia faça parte dele.
Além
disso, numa época de tantos extremos como este em que vivemos, é fundamental o
equilíbrio que só a Bíblia oferece. Sabemos que hoje existem desde aqueles que
vêem toda e qualquer manifestação entusiástica como avivamento, até àqueles que
negam a sua existência, ou quando muito acham que avivamento é a mais nova onda
do momento, uma coqueluche moderna, uma inovação humana sem respaldo bíblico. É
necessário, mais do que nunca, recorrermos à lei e ao testemunho.
Permita-me
ilustrar o que queremos dizer por "extremos". Edwin Orr (10), uma das
maiores autoridades sobre avivamentos, disse que viu duas igrejas nos Estados
Unidos convidando pessoas para suas reuniões de avivamentos. Uma delas dizia:
"Reavivamento aqui todas às segundas-feiras à noite", enquanto que a
outra prometia: "Reavivamento aqui todas às noites, exceto às
segundas-feiras". Orr menciona este fato para relatar um desses extremos
em que a palavra "avivamento" ou "reavivamento" é usada
aleatoriamente, como se o avivamento fosse produzido simplesmente pelo desempenho
humano com data e hora marcadas.
Voltando
ao lugar da Bíblia no avivamento, é importante salientar que ela foi, é e
sempre será a espada do Espírito Santo em todo avivamento bíblico. Não existe
verdadeira espiritualidade sem a Bíblia. Observando os avivamentos ocorridos na
Bíblia e na história da igreja, notamos que os objetos do Espírito eram sempre
persuadidos com e para a Bíblia. Avivamento onde a Bíblia não está presente não
passa de um mero pentecostalismo convencional.
"Um
reavivamento", diz o Dr. Héber de Campos, "que é produto da obra do
Espírito Santo na igreja, certamente tem sua ênfase naquilo que tem sido
esquecido por muito tempo: a Palavra de Deus. A autoridade da Palavra de Deus
passa ser algo extremamente forte num momento genuíno de reavivamento. A Bíblia
passa novamente a ser honrada como a única Palavra inspirada de Deus"
(11).
2) O padrão bíblico de avivamento está na Bíblia
Os primórdios do avivamento bíblico aparecem em Gênesis. Segundo Coleman, o que
se pode chamar de "o grande despertamento geral" ocorreu nos dias de
Sete, pouco depois do nascimento de seu filho Enos: "Então se começou a
invocar o nome do Senhor" (Gn 4.26) (12). O nome Enos quer dizer fraco ou
doente. O que é deveras significativo. Considerando o assassinato de Abel (Gn
3.9-15) e o aparecimento cada vez mais forte de doenças na raça humana, o nome
Enos era bastante adequado. "É provável que fosse um reflexo da
consciência da depravação humana e da necessidade da graça divina" (13). À
parte desta indicação não existe nenhum outro relato de avivamento no princípio
da história da raça humana. O relato subseqüente do dilúvio ilustra de modo
dramático o que acontece com um povo que não se arrepende de seus pecados.
Depois
temos os patriarcas que por vários séculos lideraram o povo de Deus. Sempre que
a vitalidade espiritual do povo se desvanecia, eles agiam como a força que
promovia novo vigor. O breve avivamento na casa de Jacó é um bom exemplo disso
(Gn 35.1-15). Mais tarde, sob a liderança de Moisés, há períodos empolgantes de
refrigério, especialmente nos acontecimentos ligados à primeira páscoa (Ex
12.21-28), na outorga da lei do Senhor no Sinai (Ex 19.1-25; 24.1-8;
32.1-35.29) e no levantamento da serpente de bronze no monte Hor (Nm 21.4-9).
No
tempo de Josué um despertamento espiritual predominou em suas campanhas, como
na travessia do rio Jordão (Js 3.1-5.12) e na conquista de Ai (Js 7.1-8.35).
Mas quando terminaram as guerras e o povo se assentou para desfrutar os
despojos da vitória, uma apatia espiritual se apoderou da nação. Sabendo que seu
povo estava dividido, Josué reuniu as tribos de Israel, em Siquém, e exigiu que
cada um escolhesse, de uma vez por todas, a quem servir (Js 24.1-15). Um
verdadeiro avivamento segue-se a esse desafio, prosseguindo durante "todos
os dias de Josué, e todos os dias dos anciãos que ainda viveram muito tempo
depois de Josué, e sabiam toda a obra que o Senhor tinha feito a Israel"
(Js 24.31).
O
período de trezentos anos de liderança dos juízes mostra os israelitas, de
quando em quando, traindo o Senhor e servindo a outros deuses. O juízo de Deus
é inevitável. Então, após longos anos de opressão, o povo se arrepende e clama
ao Senhor (Jz 3.9,15; 4.3; 6.6,7; 10.10). Em cada ocasião Deus responde as
orações, enviando-lhes um libertador que liberta o povo na vitória contra os
inimigos. Um dos maiores movimentos avivalistas aparece no final desse período,
sob a direção de Samuel (I Sm 7.1-17).
Tempos
de renovação ocorreram periodicamente no período dos reis. A marcha de Davi,
entrando com a arca em Jerusalém, possui muitos ingredientes de um avivamento
(2 Sm 6.12-23). A dedicação do templo, no início do reinado de Salomão, é outro
grande exemplo (I Rs 8). O avivamento também chega a Judá nos dias de Asa (I Rs
15.9-15). E Josafá, outro rei de Judá, lidera uma reforma (I Rs 22.41-50), bem
como o sacerdote Joiada (2 Rs 11.4-12.16). Outro poderoso despertamento é
vivenciado na terra sob a liderança do rei Ezequias (2 Rs 18.1-8). Por fim, a
descoberta do livro da lei, durante o reinado de Josias, dá início a um dos
maiores avivamentos registrados na Bíblia (2 Rs 22,23; 2 Cr 34,35).
Ainda,
sob a liderança de Zorobabel e Jesua, outra vez começa a reacender um novo
avivamento (Ed 1.1-4.24). Tendo as intimidações dos inimigos induzido os judeus
a interromperem a reconstrução do templo, os profetas Ageu e Zacarias entraram
em cena para instigar o povo a prosseguir (Ed 5.1-6.22; Ag 1.1-2.23; Zc 1.1-21;
8.1-23). Setenta e cinco anos depois, com a chegada de outra expedição liderada
por Esdras, novas reformas são iniciadas em Jerusalém, dando-se mais atenção à
lei (Ed 7.1-10.44). O avivamento alcança o auge poucos anos depois, quando
Neemias se apresenta para completar a construção dos muros de Jerusalém e
estabelecer um governo teocrático (Ne 1.1-13.31).
Uma
oração por avivamento e a promessa de sua ocorrência encontramos também em Joel
2.28-32; Habacuque 2.14-3.19 e Malaquias 4.
No
apogeu de um grande avivamento Jesus aparece e é batizado por João Batista.
Escolhe e treina seus discípulos; ascende aos céus, deixando-os na expectativa
de receberam a promessa do Espírito (Lc 24.49-53; At 1.1-26). O poderoso
derramamento do Espírito Santo, no dia de Pentecostes, inaugura o avivamento
que Jesus havia predito (At 2.1-47). "Marca-se, assim, o início de uma
nova era na história da redenção. Por três anos Jesus trabalhara na preparação
desse dia - o dia em que a Igreja, discipulada por intermédio de seu exemplo,
redimida por seu sangue, garantida por sua ressurreição, sairia em seu nome a
proclamar o Evangelho 'até os confins da terra' (At 1.8)" (14).
O
livro de Atos registra a dimensão desse avivamento. Avivamento em Jerusalém, em
Samaria, em Antioquia da Síria e em Éfeso. E de lá para cá, são muitos os
relatos da obra vivificadora do Espírito Santo na história da igreja, como por
exemplo, na Alemanha com a Reforma Protestante do século XVI, na Inglaterra no
século XVIII, entre os negros Zulus da África do Sul na década de 60 e na
Coréia do Sul nestes últimos tempos, dentre outros.
Que
Deus derrame do seu Espírito sobre nós para que possamos, como igreja e povo
brasileiros, experimentar mais uma vez daquele "fogo abrasador" que
nos purifica e nos santifica para uma vida cristã de obediência à sua Palavra.
NOTAS:
(1) Cf. D. M. Lloyd-Jones, DO TEMOR À FÉ (2ª ed. São Paulo: Editora Vida,
1987), pp. 73,4. Veja também, de Gerard Van Groningen, AVIVAMENTO SOB UM PRISMA
VÉTERO-TESTAMENTÁRIO no site www.ipcb.org.br.
(2) Os termos "avivamento", "reavivamento",
"renovação", "despertamento", "vivificação",
"reviver" e "tornar a viver" são usados no mesmo sentido.
(3) O significado literal da expressão hebraica "vivificar-nos", do
Salmo 85.6, é "causa-nos viver", onde se reconhece que a vitalidade
espiritual depende inteiramente de Deus.
(4) O Novo Comentário da Bíblia, Edições Vida Nova, dá a este Salmo o sugestivo
título: UMA ORAÇÃO PEDINDO REAVIVAMENTO.
(5) Para um ponto de vista diferente, veja a obra do Dr. Paul E. Pierson, A
HISTÓRIA DOS AVIVAMENTOS, material apostilado pela Faculdade Teológica Sul
Americana de Londrina - PR.
(6) Uma posição semelhante foi apresentada pelo Rev. Edijéce Martins Ferreira,
em entrevista ao Jornal Brasil Presbiteriano (Abril/94, p. 12):
"Confunde-se avivamento com atitude pessoal e inclusive corporal (física),
com expressão emocional, levantar de mãos, etc. Essas atitudes em si não são
propriamente prejudiciais. Todavia, pela confusão que se faz a doutrina sai
perdendo. Há uma superficialidade doutrinária muito grande, porque se dá ênfase
excessiva ao louvor, a sermões eletrizantes, a práticas pentecostais, quando
avivamento é tão somente uma consciência clara e profunda da vontade de Deus
(que é doutrinária) e uma disposição plena de obediência (que é prática)".
(7) R. Coleman, A CHEGADA DO AVIVAMENTO MUNDIAL (São Paulo: CPAD, 1996), p. 18.
(8) D. M. Lloyd-Jones, OS PURITANOS: SUAS ORIGENS E SEUS SUCESSORES (São Paulo:
PES, 1993), pp. 15,6. Veja também, do mesmo autor, o excelente livro AVIVAMENTO
(São Paulo: PES, 1992) 320 pp.
(9) Héber C. Campos, CRESCIMENTO DA IGREJA: COM REFORMA OU COM REAVIVAMENTO? In
Fides Reformata, Vol I, Nº 1 (São Paulo: 1996), pp. 44,5.
(10) Citado por Brian H. Edwards em REVIVAL! A PEOPLE SATURED WITH GOD
(England: Evangelical Press, 1994), p. 25.
(11) H. C. Campos, op. cit., p. 45.
(12) R. Coleman, op. cit., p. 53.
(13) Idem.
(14) Idem, p. 61.
Rev. Josivaldo de França Pereira -
Pastor da Igreja Presbiteriana do Brasil (I.P.B.) em Santo André - SP. Bacharel
em teologia pelo Seminário Presbiteriano Rev. José Manoel da Conceição (J.M.C.
- SP), Licenciado em filosofia pela F.A.I. (Faculdades Associadas Ipiranga -
SP) e mestrando em missiologia pelo Seminário Teológico Sul Americano
(S.T.S.A.) em Londrina - PR.
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